Impacto do capital cultural na mobilidade social: o caso das escolas profissionais de música

Abstract

Esta investigação analisa o impacto da formação escolar profissionalizante em música na criação de capital cultural e na mobilidade social ascendente dos seus diplomados. Assume-se como caso de estudo os diplomados e as suas famílias, das quatros escolas profissionais de música no Norte de Portugal. De acordo com as teorias da reprodução e da distinção de Bourdieu, o capital cultural é um importante instrumento na reprodução de desigualdades sociais, pelo que as condições socioculturais familiares de origem são determinantes na diferenciação dos resultados escolares dos descendentes, no desenvolvimento das suas carreiras profissionais, na construção de preferências e nos comportamentos de consumo cultural. As mesmas teorias associam a estratificação social à criação de um gosto popular ou erudito, em função da existência, ou não, de capital cultural, condição necessária à compreensão de códigos e apreciação de bens simbólicos. Por seu lado, a investigação educativa produzida, a partir da década de setenta do século XX, tem vindo a reconhecer à escola e ao efeito-escola um importante papel no sucesso escolar e na definição de trajetórias de vida, invertendo o caráter fatalista da reprodução social familiar de origem. Num paradigma de mobilidade cultural, o atual debate sobre o omnivorismo cultural reconhece, nas sociedades atual, a existência de um novo perfil de participação cultural omnívora, que se traduz num leque alargado de preferências e de consumos, desde a arte erudita a manifestações próprias de subculturas populares. A análise sociológica do consumo acrescenta as trajetórias escolares, ocupações profissionais e estilos de vida como importantes fatores de estruturação do gosto em dialética com os fenómenos do consumo e das hierarquias culturais. Na investigação empírica realizada aplicam-se indicadores que permitem analisar o processo de criação de capital musical, através da socialização escolar, e os comportamentos de consumo cultural, desde a infância à idade adulta. Utilizam-se o questionário aplicado aos diplomados das EPM, complementado com entrevistas aos diretores e quadros pedagógicos intermédios das escolas como instrumentos. Constata-se que a ocupação profissional dos diplomados, o nível máximo de escolaridade atingido e os consumos musicais eruditos estão associados à trajetória escolar na EPM e são independentes das condições sociais familiares de origem, num modelo de mobilidade social ascendente intergeracional. Concluiu-se que a ampliação de capital musical construído na socialização escolar aumentou o processo de mobilidade social dos alunos, viabilizando o posterior acesso a ocupações profissionais de maior prestígio. Simultaneamente, assistiu-se a uma mudança dos padrões de consumo musical popular, através da incorporação de preferências pelo reportório musical de tradição europeia ocidental, num modelo de translação cultural independente da estratificação social de classe de origem familiar. No entanto, concluiu-se que o capital musical construído e refletido no gosto e nos comportamentos de consumo em adulto não conduziu os diplomados a um padrão de participação cultural omnívoro, comportamento que atualmente a sociologia de consumo reconhece como atributo das sociedades contemporâneas desenvolvidas.

This dissertation presents an analysis of the impact of musical education in a professional context on the creation of cultural capital and the upward social mobility of its graduates. The case studies here presented include the graduates and their families from four “Professional Schools” located in the North of Portugal. According to Bourdieu’s theories of “reproduction” and “distinction”, cultural capital is an important instrument in the reproduction of social inequality, and the specificities of family sociocultural origins are considered essential to the differentiation of the children school results, their access to professional careers, the construction of their cultural “choices” and their behavior as cultural consumers. The same theories associate social stratification with the creation of “popular” versus high culture taste, as a result of the existence or absence of cultural capital, and as a condition for the understanding and fruition of symbolic codes and goods. Moreover, the educational research produced after the 70s in the XX century, has been recognizing an important role to schooling and to the “schooling-effect” in the success of education and the positive definition of individual life trajectories, as well as it inverts the fatalist character of the reproduction of family sociocultural conditions. Within a paradigm of cultural mobility, the contemporary debate on cultural omnivorism recognizes in today’s society the existence of a new profile of omnivorous cultural participation, which is translated in a wide range of consume preferences, from high art to specific demonstrations of popular subcultures. The sociological analysis of consumption reinforces schooling trajectories, professional occupations and life styles as fundamental factors in the structuring of “taste” within a dialectic process with consumption issues and cultural hierarchies. In the empirical research carried out throughout this work were used indicators which allowed us to analyze the process of the creation of musical capital through the process of schooling socialization and the behaviors of cultural consumption, from childhood to adult age. The graduates from EPM were asked to answer questionnaires, which were complemented with interviews to the directors and intermediate pedagogic management of the schools, as empirical instruments. One realizes that the professional occupation of graduates, the maximum level of schooling reached and their high art musical choices are distinctively associated with the individual schooling trajectory in EPM and, independently of the family social origins, they are inscribed within a model of intergenerational upward social mobility. The conclusion of our analysis is that the widening of the musical capital built within the schooling socializing has increased the process of the students social mobility, enabling the ulterior access to a more prestigious professional occupation. In tandem with this, one recognizes the change

and transformation of the patterns of popular musical consumption, via the incorporation of a “preference” for a musical repertoire within the Western European tradition, as a model of cultural translation which is independent from the social stratification of family origin. Notwithstanding, our conclusion is that the acquired musical capital reflected in the “taste” and the consume behavior of the adult individual has not led the graduates to a pattern of cultural omnivorous consumption, which today’s sociology of culture recognizes as an attribute of contemporary developed societies.